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terça-feira, 28 de julho de 2015

Um novo produto à venda: O Semianalfabeto

O analfabeto aos poucos tende a desaparecer e com ele termina um ciclo da cultura popular. No seu lugar nasce seu sucessor mais próximo e imediato, um novo indivíduo, fabricado para ser um consumidor fanático. O analfabeto está sendo transformado em semianalfabeto, para alguns, cerca de 90% da população do nosso querido Brasil.
Os dois têm pontos em comum, mas têm suas di­ferenças. Os primeiros, nossos antepassados, livres do domínio de seus atuais donos, vivendo mais isolados em seus grupos - ainda não existia a “aldeia global” - foram mais criativos, inventaram as ciências, as pinturas, canções, escritas e estabeleceram os valores. Os semianalfabetos, ao contrário, nada criaram, seguem ca­bisbaixos seus donos.
Estes, ainda que possam parecer atraentes por fora, são vazios por dentro. Uma vez promovidos a semialfabe­tizados, prenderam-se nas redes preparadas pelos que os ensinaram a ler e a escrever, tornando-os presas fáceis de serem manipulados pelas classes empresariais que ajuda­ram a criá-lo e que passaram a ser o tutor desse grupo. Hoje o semialfabetizado representa o principal cidadão-al­vo do comércio, é o homem comum, o medíocre, o fácil de ser manipulado.

No lugar da cultura popular criada pelos analfabetos, seu antecessor nada produziu. Não temos e nem teremos uma cultura do semianalfabeto, vai morrendo a cultura po­pular, talvez enlaçada com a cultura sofisticada.
O grupo dos semialfabetizados vai, pouco a pouco, aumentando seu número. Fabricado aos milhares sem cui­dado ou técnica apurada, dentro do modelo usado na fabri­cação dos chinelos de liga, eles diferem, tanto do seu irmão analfabeto livre e mais reflexivo, como do outro, o culto, o acostumado a ler, construído dura­mente, um a um, com cuidado e dedicação. Apesar disso, os semialfabetizados estão alegres, sorriem, mostrando os dentes claros e brilhantes para seus proprietários. É uma felicidade ingênua, estranha e servil.
Seus senhores, principalmente os políticos, sempre bem acompanhados e protegidos pelos empresários, co­nhecedores do fim dos seus produtos e dos investimen­tos feitos, manipulam cuidadosamente estes infelizes para alcançarem seus objetivos. Fornecem-lhes cartilhas para lerem, textos simples, de fácil compreensão, nada de com­plicado, propositadamente preparados para eles. Os tex­tos fáceis, digeríveis na primeira passagem, carregados de noções falsas, têm como finalidade básica impedi-los de pensar por si, isto é, de usar suas mentes num progra­ma de benefício próprio. Mas a presença dos livros, a ida às aulas, as amizades formadas nas escolas conseguem diverti-los, bem como mantê-los unidos. Entretanto, dada a simplicidade do estudo lecionado, na maioria das ve­zes por pessoas não-sofisticadas, eles se transformam em pessoas ainda mais incapazes de fazer uso da inteligência e crítica. Como robôs, aprendem a comportar-se em blo­cos, não mais como indivíduos, a pertencer a um certo partido político e votar num determinado candidato, a se­guir a religião em moda, a comprar certas mercadorias, a defender certas ideias desconhecidas, escondidas e nunca acessíveis a eles.
Estes pseudoalfabetizados foram construídos para se­guirem os comandos, não para pensarem, jamais refleti­rem e perguntarem: “o que quero, o que devo fazer com minha curta vida?“. Orgulhosamente, de modo semelhante a outros animais, mais abaixo na escala zoológica, como cães, galos e lagartos, eles buscam o fundamental da vida animal: alimentar-se, procriar e ter sua toca para lhes dar segurança contra os predadores, que são, principalmente, os próprios dirigentes aliados a eles.
Eles vivem quase que exclusivamente o momento presente, o “aqui e agora”, transmitidos com orgulho, en­quanto seus proprietários, desejando vender aparelhos e ideias, planejam o futuro onde eles são os consumidores cegos. Eles respondem aos estímulos do meio ambien­te de forma direta, sem intermediação de seu “Eu”, pois este foi bloqueado, encontra-se enferrujado, incapaz de ser usado.
Não possuindo planos individuais próprios, estes in­divíduos agem como certas espécies de animal: formigas, abelhas, cupins. O indivíduo separado existente dentro dele, com história própria, foi assimilado pelo grupal, pelo social, que é valorizado acima de tudo. Todos têm as mes­mas ideias, os mesmos ideais, os mesmos instrumentais para chegarem onde supõem querer, as mesmas alegrias e tristezas, todos seguem os mesmos planos do grupo co­eso. Não há dissidentes. Num programa de auditório é fá­cil verificar este comportamento: a pessoa escolhida para opinar na roleta da sorte, antes de decidir a resposta a es­colher, sempre ouve o auditório. É a voz do grupo, do qual ela faz parte, que decide; o grupo sentencia se ela deve parar de apostar e ganhar um prêmio menor, ou continuar e arriscar-se a perder tudo.
Seus ouvidos, estão presos ao auditório, este lhe or­dena, na ausência do chefe, o que deve fazer. Ela obedece servilmente, com naturalidade e sorridente, ao comando externo.
Os semialfabetizados, iguais na conduta, têm, entre­tanto, diferenças em algumas características, que são exi­bidas com orgulho, tais como a impressão digital, o CPF, a rua e o número da residência, o modo de escrever a primeira letra do seu nome e ainda o modo de pentear o cabelo e de fazer a macarronada.

Eles não possuem uma mente crítica individual, ba­seada na sua história pessoal diferente dos seus outros ir­mãos da mesma espécie. No seu ingênuo modo de pensar, ignorante da própria ignorância, este indivíduo, confiante ao se julgar, percebe-se como bem informado e capaz, pois lê determinadas revistas, por sinal muito instrutivas. Sua mente pouco trabalhada e quase sem ser usada, permitiu-lhe decifrar, orgulhosamente, as instruções de manejo de cartões de banco, de instrumentos do seu trabalho rotinei­ro, de ligar o aparelho de televisão, de ir aos restauran­tes e comer com os talheres apropriados, de conhecer as roupas que estão na moda, de conhecer e viajar para os lugares “badalados”, de usar a nova cueca lançada, o per­fume moderno, a nova aplicação bancária e muitas outras atrações sedutoras do mesmo gênero, que indicam infor­mações importantes para se viver. Coitado!
Tudo nesse mundo de Deus tem suas vantagens. Proi­bidos de pensar, os semialfabetizados não se sentem cul­pados por possuir uma mente quase nula. Estão tranquilos, talvez não sofram infartos, hipertensão arterial, úlceras e insônia, como ocorre com seus donos, sempre preocupa­dos com os sucessos e insucessos dos planos.
Com pouca ou nenhuma vontade própria, impedidos de tomar decisões particulares, sem responsabilidade por suas ações, eles caminham, moribundos, para seu fim. Descartando o complicado, evitando aprofundar-se nas ta­refas e soluções que exigem cadeias de raciocínios longas e tortuosas, eles vivem felizes na sua gaiola de bambu, onde existe cama, sexo e comida, desfrutando da liberda­de imaginada e que eles não têm.
Estão sempre esperando alguém: “as autoridades”, os mais “inteligentes”, os espertos pensarem e resolverem seus problemas, decidirem por eles. 
Seu amor romântico é imbecil. Para este grupo, “amar” significa a posse da pessoa amada. Quando estes indivíduos dizem “eu te amo”, a frase indica ”eu preciso de você, sem você minha vida será uma desgraça, pois não tenho mais ninguém para pensar por mim, para ajudar-me, encostar-me, estou perdido, nada tenho para dar, pre­ciso receber seu apoio e sua piedade”.
No amor este grupo nada oferece, nada dá, exige do ou­tro responsabilidade por sua vida, que eles não têm. Mas cha­mam tudo isto de “amor”, de “gostar” muito do outro. Quando percebem que não podem receber do amado o apoio dese­jado, o amor que ele próprio não tem dentro de si, que terá de dar algo que ele jamais pensou em possuir, este indivíduo retira-se frustrado por não ter sido amado. Na sua mente ele amou muito, deu muito de si: deu o nada para o outro.
Este grupo tem como lema fundamental: “É preci­so aproveitar a vida”. Tal afirmativa significa: distrair-se o mais que puder, esquecer que está vivo, que não comanda suas ações, que não manda na sua vida. Eles precisam se divertir, continuamente, com as brincadeiras fornecidas e preparadas pelo mundo externo a ele. Ler o livro mais ven­dido, ir ao parque no domingo, dançar no baile dos idosos ou do carnaval, comprar o bilhete da loto, ir ao jogo ou vê-lo na TV. Estas diversões são organizadas com precisão matemática pelos senhores do poder, governo e empresá­rios, de modo a dar tudo certo. As autoridades sabem o que é  melhor para ele, mais do que ele próprio, pois lhe faltam os instrumentais capazes de fornecer um retrato de si mesmo, de se autoexaminar com alguma precisão, seu diagnóstico é sempre dado pelos de fora.
Lamentável e criminosamente sua mente foi lacrada, muito bem fechada ainda muito cedo, impedindo a invasão de incômodas ideias capazes de fazerem desmoronar cren­ças firmes, pilares vindos de longe, infelizmente muitos deles já podres. Nada de ideias novas, principalmente as diferentes das costumeiras, das antigas e repetidas pelas suas sábias mães virtuosas e dignas de crédito. Estes indi­víduos fogem como podem da intromissão de teorias con­trárias às suas, que poderiam desmoronar, abruptamente, tudo o acreditado, destruir para sempre seu frágil sistema de pensamentos mal arranjados, sua instável estrutura mental mal elaborada e mal pregada em estruturas tortas, em princípios duvidosos, muitas vezes mágicos.
Apoiado em fundamentos adquiridos na cultura onde foi educado, sem dúvidas, o semianalfabeto recusa subme­ter-se a investigações internas, a reflexões acerca da vali­dade ou não dos pilares que deram origem ao seu raciocí­nio. Sua segurança está fora dele, apoia-se nos outros - “o presidente falou”, “meu chefe me disse”, “li no jornal” - nos proprietários de suas ideias, ou mesmo nos seus amigos de infortúnios ludibriados pelas mesmas crenças: - “tenho certeza disso, todos nós pensamos assim”. Como ele está bem acompanhado, pela maioria da população, confiantes no falso princípio de que a “maioria tem razão”, ou que “a voz do povo é a voz de Deus”, o semi-analfabeto sente-se protegido, confortável e até feliz. Não perderá seu precio­so tempo com bobagens, tais como refletir acerca de si ou do mundo em que vive. Precisa, sim, divertir-se, assistir à novela das oito. Semimorto como indivíduo, vivendo ape­nas como espécie, o semianalfabeto não tem forças para examinar se sua vida vale a pena ser vivida como está, ou se deve ser destruída, mudada, para construir outra mais digna do homem que ele poderá vir a ser.
Fonte: Galeno Alvarenga- Psiquiatra / Neuroligista

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